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PEC 45-A/19: os riscos do manicômio tributário se tornar um Frankenstein

Por Roberto Folgueral
Contador tributarista, perito judicial e vice-presidente da FCDL-SP

Apenas para iniciarmos as considerações, lembro do SPED (Sistema Público de Escrituração Digital), criado em 2003 e implantado em 2009, definido como algo para agilizar o processo e auxiliar do contribuinte. Em 2008, participando de reunião com o Dr. Jorge Antônio Deher Rachid — auditor fiscal de carreira que exerceu a função de Secretário da RFB (Receita Federal do Brasil) de 01/2003 a 07/2008 e, depois, de 01/2015 a 01/2019 –, escutei-o dizer: “com a implementação do SPED, a reforma tributária está concluída no Brasil”! Agora, com a divulgação da PEC 45-A, que trata da reforma tributária, entendi de forma completa a afirmação do Dr. Jorge Rachid.

É um equívoco dizer que a Reforma Tributária, tal qual apresentada e aprovada, foi fruto de ampla discussão por décadas. Poder-se-ia dizer que foi discutida em algumas poucas horas e aprovada de forma açodada em sessão semipresencial. Até 2026, quando se iniciará de fato a reforma tributária, haverá muito o que se dizer, discutir, convalidar e negociar. Essa aprovação foi apenas o início do começo de algo que se findará, tal qual proposto, em 2078.

O proposto, segundo alguns, busca colocar o pobre no orçamento e o rico no imposto de renda, mas, na realidade, sem a análise das Leis Infraconstitucionais, trará um relativo aumento nos custos de operação e assim, um aumento maior nos preços finais ao consumidor pelo aumento da carga tributária. O “rico” tem como repassar seus custos ao consumidor final, diferentemente daquele que apenas pagará mais pelo aumento dos tributos.

Acredito mesmo que o sistema apresentado possa ser mais simples, com a união e rebatizamento de alguns tributos, mas está longe de ser um sistema equilibrado, pois coloca todos os entes federativos numa mesma “bacia”, ignorando suas necessidades de investimentos passados, presentes e futuros em infraestrutura tributária e de conformidade fiscal. Inclusive, perderão a capacidade de gestão em seus orçamentos.

Precisamos simplificar nosso sistema tributário, sem dúvida alguma. Dificultar a evasão tributária — o que já é feito com excelente desempenho pela RFB através do SPED –, mas não podemos criar mais injustiças, onde o pequeno contribuinte tem um custo infinitamente maior que o grande, para apurar seus tributos.

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Sou favorável à mudança com a adoção de um IVA (Imposto sobre o Valor Agregado) pleno, não como está previsto para ser: de forma dual para alguns produtos, setores ou regiões, e com alguns beneficiados e muitos prejudicados.

Um sistema no qual poder-se-ia manter as três esferas administrativas com sistemas tributários, tendo como base de cálculo somente o seu valor agregado, para todos os contribuintes independentemente do setor – Industria, Comércio ou Serviço.

Não consigo entender como uma proposta dessa magnitude possa ter sido analisada e discutida em tão curto espaço de tempo, sem nenhum estudo REAL NUMÉRICO sobre seus verdadeiros impactos sobre a sociedade. Não há apresentação de alíquotas, seus impactos na arrecadação total regional e seus reais impactos no preço final dos produtos, bens e serviços.

O sistema de votação da proposta na forma semipresencial demonstra, inclusive, a pouca relevância que deram ao fato, que é extremamente importante e impactará em nossas vidas nos próximos 50 anos. Resumindo, criamos uma proposta que nos tira do manicômio tributário, e para tal, geramos um “FRANKENSTEIN TRIBUTÁRIO” sem apresentação de nenhum dado por parte da RFB.

Espero e desejo que até o final de 2025, possamos realizar algumas cirurgias plásticas em nosso Frankenstein, para torná-lo mais “palatável”.

Lembrando que, antes desta transformação, já temos uma carga tributária na ordem de 33%, ou seja, tudo que consumimos 1/3 fica com o Estado. E para quem duvida que haverá aumento na carga tributária, basta ler o parágrafo único do Artigo 18 do relatório final da PEC 45-A/ 2019, no qual claramente menciona que o excedente de arrecadação PODERÁ (não deverá) ser considerado como fonte para compensação para a redução dos tributos sobre a folha de pagamento e sobre o IBS (Imposto de Bens e Serviço).

Síntese da reforma tributária

CBS – Contribuição Sobre Bens e Serviços, nova denominação do PIS/COFINS
IBS – Imposto Sobre Bens e Serviços – Subnacional, nova denominação do ICMS E DO ISSQN.
I.S. – Imposto Seletivo Federal, nova denominação do IPI, incidente sobre a produção, comercialização ou importação de bens e serviços prejudiciais à saúde ou meio ambiente.
Alguns destaques do texto da PEC 45-A/19

Serão regulamentados por lei completares e um conselho federativo para o IBS;
As alíquotas referencias serão fixadas pelo Senado Federal ou pelos Estados/Municípios, por Leis especificas para todas as operações de bens e serviços;
Não cumulatividade: na prática não é isso, pois dependerá de produtos e dos setores envolvidos;
Criação de um Fundo Nacional de Desenvolvimento Regional: tem a proposta de reduzir a desigualdade regional e também será regulamentado por Lei Complementar, com o risco de surgir um congresso tributário paralelo e aumentar ainda mais a insegurança jurídica.
Pontos relevantes tratados como irrelevantes

Será regulamentada essa Reforma Tributária por uma ou várias Leis Complementares?
A CF poderia regular os pontos controversos para maior segurança.
Como ficarão as obrigações acessórias? Serão unificadas? E no caso do Simples Nacional, quanto à alíquota de referência, quais os parâmetros de piso e teto?
Qual a competência do Conselho Federativo do IBS? Como se dará o compartilhamento da gestão, sua paridade ou critérios?
Quem fará a conformidade fiscal, tributária e contábil dos novos tributos?
Qual o impacto da insegurança jurídica trazida pelo Imposto Seletivo, devido à subjetividade ou desvios posteriores?
O Imposto Seletivo integrará a base de Cálculo da CBS e do IBS?
Como se processará os créditos dos tributos em etapas anteriores?
Aguardar a Lei Complementar para determinar o que será “uso e consumo”.
Operações externas, quem será o sujeito passivo da obrigação tributária?
Somente para exemplificar, como será o critério de “atividades artística e culturais nacionais que serão sujeitos às reduções de IBS e da CBS?
Como foi definido os prazos para compensações dos créditos tributários e índice de atualização?
*Este texto reproduz a opinião do autor e não reflete necessariamente o posicionamento do portal Varejo S.A. e do Sistema CNDL.